Hoje, 31 de dezembro, último dia do ano, a Igreja celebra São Silvestre. São
Silvestre I apagou-se ao lado de um Imperador culto e ousado como Constantino,
o qual, mais que servi-lo se terá antes servido dele, da sua simplicidade e
humanidade, agindo por vezes como verdadeiro Bispo da Igreja, sobretudo no
Oriente, onde recebe o nome de Isapóstolo, isto é, igual aos apóstolos.
E na
realidade, nos assuntos externos da Igreja, o Imperador considerava-se acima
dos próprios Bispos, o Bispo dos Bispos, com inevitáveis intromissões
nos próprios assuntos internos, uma vez que, com a sua mentalidade ainda pagã,
não estava capacitado para entender e aceitar um poder espiritual diferente e
acima do civil ou político.
E
talvez São Silvestre, na sua simplicidade, tivesse sido o Papa ideal para a
circunstância. Outro Papa mais exigente, mais cioso da sua autoridade, teria
irritado a megalomania de Constantino, perdendo a sua proteção. Ainda estava
muito viva a lembrança dos horrores por que passara a Igreja no reinado de
Diocleciano, e São Silvestre, testemunha dessa perseguição que ameaçou
subverter por completo a Igreja, terá preferido agradecer este dom inesperado
da proteção imperial e agir com moderação e prudência.
Constantino
terá certamente exorbitado. Mas isso ter-se-á devido ao desejo de manter a paz
no Império, ameaçada por dissenções ideológicas da Igreja, como na questão do
donatismo que, apesar de já condenado no pontificado anterior, se vê de novo
discutido, em 316, por iniciativa sua.
Dois
anos depois, gerou-se nova agitação doutrinária mais perigosa, com origem na
pregação de Ario, sacerdote alexandrino que negava a divindade da segunda
Pessoa e, consequentemente, o mistério da Santíssima Trindade. Constantino,
inteirado da agitação doutrinária, manda mais uma vez convocar os Bispos do
Império para dirimirem a questão. Sabemos pelo Liber Pontificalis, por
Eusébio e Santo Atanásio, que o Papa dá o seu acordo, e envia, como
representantes seus, Ósio,
Bispo de Córdova,
acompanhado por dois presbíteros.
Ele,
como dignidade suprema, não se imiscuiria nas disputas, reservando-se a
aprovação do veredito final. Além disso, não convinha parecer demasiado
submisso ao Imperador.
Foi o
primeiro Concílio Ecumênico (universal) que reuniu em Niceia, no ano 325, mais
de 300 Bispos, com o próprio Imperador a presidir em lugar de honra. Os Padres
conciliares não tiveram dificuldade em fazer prevalecer a doutrina recebida dos
Apóstolos sobre a divindade de Cristo, proposta energicamente pelo Bispo de
Alexandria, Santo Atanásio. A heresia de Ario foi condenada sem hesitação e a
ortodoxia trinitária ficou exarada no chamado Símbolo Niceno ou
Credo, ratificado por S. Silvestre.
Constantino,
satisfeito com a união estabelecida, parte no ano seguinte para as margens do
Bósforo onde, em 330, inaugura Constantinopla, a que seria a nova capital do
Império, eixo nevrálgico entre o Oriente e o Ocidente, até à sua queda em poder
dos turcos otomanos, em 1453.
Data
dessa altura a chamada doação constantiniana, mediante
a qual o Imperador entrega à Igreja, na pessoa de S. Silvestre, a Domus Faustae, Casa
de Fausta, sua esposa, ou palácio imperial de Latrão (residência papal até Leão XI), junto ao
qual se ergueria uma grandiosa basílica de cinco naves, dedicada a Cristo
Salvador e mais tarde a S. João Batista e S. João Evangelista (futura e atual
catedral episcopal de Roma, S. João de Latrão). Mais tarde, doaria igualmente a
própria cidade.
Depois
de um longo pontificado, cheio de acontecimentos e transformações profundas na
vida da Igreja, morre S. Silvestre I no último dia do ano 335, dia em que a
Igreja venera a sua memória. Sepultado no cemitério de Priscila, os seus restos
mortais seriam transladados por Paulo I (757-767) para a igreja erguida em sua
memória.
São
Silvestre, rogai por nós!
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